O escândalo conhecido como caso Koldo continua a abalar o panorama político espanhol, após as últimas revelações do relatório elaborado pela Unidade Operacional Central (UCO) da Guardia Civil.
O documento de 490 páginas revela novos aspetos do alegado esquema de corrupção que implica diretamente o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e um dos seus principais dirigentes.
O relatório da UCO coloca Santos Cerdán, o atual Secretário de Organização do PSOE, como uma figura-chave na alegada estrutura de corrupção. De acordo com as investigações, Cerdán teria atuado como "responsável pelo pagamento" de subornos relacionados com a adjudicação irregular de obras públicas que beneficiaram tanto José Luis Ábalos como Koldo García.
A documentação analisada pelos agentes revela que a ligação entre Cerdán e Koldo García era claramente hierárquica, estabelecendo uma relação de subordinação entre o antigo assessor de Ábalos e o número três do partido socialista. Esta estrutura organizacional sugere um sistema bem estabelecido de relações de poder no seio da rede investigada.
Indícios de manipulação eleitoral nas primárias de 2014
Uma das revelações mais chocantes do relatório centra-se numa troca de mensagens datada de 13 de julho de 2014, durante as primárias do PSOE que culminaram com a vitória de Pedro Sánchez. Nestas comunicações, Santos Cerdán terá dado instruções específicas a Koldo García para manipular o processo eleitoral.
A UCO aponta para uma alegada fraude nas primárias do PSOE em 2014 entre Cerdán e Koldo: "Quando acabar, escreves como aqueles dois que faltam votaram sem que ninguém te veja e colocas as duas cédulas". A resposta concisa mas enérgica de Koldo: "é isso", sugere a execução imediata destas instruções irregulares.
Esta troca de palavras lança sombras sobre a legitimidade do processo interno que conduziu Pedro Sánchez à liderança do partido, levantando sérias dúvidas sobre a transparência democrática numa das organizações políticas mais importantes de Espanha.
Montantes financeiros e organização criminosa
As investigações da UCO conseguiram quantificar os alegados montantes financeiros envolvidos no esquema de corrupção. Segundo o relatório, os montantes alegadamente provenientes da Acciona e recebidos por Ábalos e Koldo, sob a direção de Santos Cerdán, ascendem a 620.000 euros. No entanto, de acordo com os critérios de Koldo García, cerca de 450.000 euros adicionais ainda estão pendentes de cobrança.
Estes números revelam a magnitude económica do alegado sistema de comissões ilegais que teria funcionado em torno da adjudicação de contratos públicos. O envolvimento de uma empresa da dimensão da Acciona neste esquema sublinha a complexidade e o alcance das práticas em investigação.
Os agentes da UCO identificaram alegados crimes de participação em organização criminosa e de suborno, o que sugere a existência de uma estrutura criminosa organizada e não de actos isolados. A frase atribuída a Cerdán, "vou buscar tudo, vou pedir tudo", reflete uma atitude que os investigadores interpretam como indicativa de uma operação de extorsão sistémica.
Intimação judicial e ações judiciais
Dada a força das provas contra Santos Cerdán, o magistrado do Supremo Tribunal ofereceu ao dirigente socialista a possibilidade de testemunhar voluntariamente. A audiência está prevista para as 10h00 do dia 25 de junho, respeitando o seu estatuto de pessoa com jurisdição, que exige um pedido ao Congresso dos Deputados para proceder à sua imputação formal.
Na véspera, a 24 de junho, José Luis Ábalos e Koldo García também comparecerão para dar as suas explicações sobre as novas conclusões contidas no relatório da UCO . Estas declarações serão cruciais para o desenvolvimento da investigação e poderão fornecer elementos adicionais para clarificar o verdadeiro âmbito da rede investigada.
Impacto no Partido Socialista
As revelações do caso Koldo ultraam a esfera judicial para se tornarem num problema político importante para o PSOE.
O envolvimento de Santos Cerdán, uma das figuras mais influentes do partido e um confidente de confiança de Pedro Sánchez, levanta sérias questões sobre os mecanismos de controlo interno e a cultura organizacional do partido. Recorde-se que Sánchez chegou ao poder em 2017, depois de ter apresentado uma moção de censura ao PP de Rajoy, devido aos casos de corrupção que assolaram o PP.
A alegada manipulação das primárias de 2014 confere uma dimensão particularmente grave ao escândalo, uma vez que põe em causa a legitimidade democrática de processos internos fundamentais. Este aspeto pode ter repercussões que ultraam as responsabilidades criminais individuais, afetando a credibilidade do partido enquanto instituição democrática.